Dando continuidade ao nosso ciclo Ilustrador Convidado, neste outono de 2011 estamos a receber Madalena Matoso, uma das criadoras mais relevantes no campo da ilustração infantojuvenil portuguesa da última década, mas também uma designer brilhante, editora e fundadora da Planeta Tangerina, casa que publicou muitos dos seus mais notáveis trabalhos. Semanalmente, Madalena Matoso aqui responde a uma das nossas perguntas e aqui apresenta uma sua ilustração de que se orgulhe particularmente.
Cria Cria: Qual foi a coisa mais interessante que aprendeu com a ilustração até hoje? Com quem? Quem é o seu ilustrador favorito? Por que razão? Quem é que imita mais? Fica irritada com isso?
Madalena Matoso: Não consigo dizer “a” mais importante. Uma das primeiras coisas que aprendi é que não temos de ser redundantes em relação ao texto, o que abre possibilidades infinitas. Há quem pense que um ilustrador não é bem um criador porque existe o texto e o ilustrador só teria de passar as palavras a imagens. Mas se pensarmos que a ilustração também pode contar histórias, procurar diferentes pontos de vista, abrir portas, refletir, fazer pensar (e mudar o mundo!), torna-se tudo mais interessante (e divertido). Os primeiros livros ilustrados que fiz faziam parte de uma coleção da editora Ática, coordenada pela Maria José Sottomayor, que era professora de literatura infantil na Escola Superior Maria Ulrich. Nessa altura, falava muito com ela pelo telefone e fui algumas vezes a sua casa. Na parede da sala, ela tinha uma coleção fantástica de originais de ilustrações e passava tardes a mostrar-me livros. O entusiasmo com que ela abria e falava de cada livro era contagiante. Lembro-me também de, nessa altura, me aperceber que o livro poderia ser trabalhado como um todo — que a capa, as guardas, uma página vazia ou outra cheia de pormenores também eram parte do objeto e “contavam a história”.
Há muitos ilustradores de que gosto. De uns, gosto pela revolução que trouxeram ao mundo dos álbuns ilustrados: o Heinrich Hoffmann, a Kveta Pacovská,… De outros, pela técnica apurada, como o Gustave Doré. Também gosto muito do trabalho da Sara Fanelli, da Harriet Russell, da Beatrice Alemagna, do Olle Eksell,… e tantos outros. Em Portugal, penso que tiveram um papel fundamental a Maria Keil, a Manuela Bacelar, o André Letria, o João da Câmara Leme,…
Mas se só pudesse escolher um ilustrador, escolheria o Bruno Munari (que, para além de ilustrador, era designer, pensador, inventor, pedagogo). Olho para os livros do Bruno Munari e parece-me que foram feitos no futuro.
Quanto às imitações: somos feitos de tudo o que vemos e vivemos, e isso traduz-se no nosso trabalho. São referências e influências que se vão acumulando. Mas acho que imitar deliberadamente o trabalho de outra pessoa não tem valor nem interesse.
ilustração originalmente publicada no livro “Uma mesa é uma mesa.” (Planeta Tangerina, 2006)
Madalena Matoso: Não podia deixar de falar deste livro. Foi o primeiro que ilustrei para o Planeta Tangerina e é um caso sério de insucesso comercial. Nós gostamos muito dele, chamamos-lhe o “flop de estimação”. Mas, por alguma razão, o público não lhe achou graça nenhuma (e eu desconfio que seja culpa das ilustrações). Teve direito a uma menção especial no Prémio Nacional de Ilustração (que, no início da nossa atividade-editorial-mais-ou-menos-séria foi muito importante), mas se iam dez exemplares para uma feira do livro, dez voltavam para casa. Se todos os livros editados tivessem tido este percurso, já não existiríamos como editora há muito tempo. Felizmente, alguns livros tiveram mais sucesso junto do público, o que nos permite ter uns insucessos comerciais de vez em quando (e ainda não houve nenhum livro de que nos tivéssemos arrependido de fazer).